quarta-feira, 26 de agosto de 2009

NUNCA MAIS? (PARTE II)




Quanto mais falava com Ana Maria, mais interessado por ela ficava (aparentemente, sabe-se lá por qual motivo, parecia ser algo mútuo); e mais pontos em comum encontrava entre nós... e entre ela e Maria Luiza, (in)felizmente. O sorriso dela, ao mesmo tempo meigo e sedutor, lembrava muito o de minha ex; assim como o olhar, penetrante e, por algum motivo, sincero... o timbre de sua voz, semelhante ao de Vanessa Krongold, vocal do Ludov, era hipnotizante; e a maneira de gesticular enquanto conversava comigo era de um grau de graciosidade tão elevado quanto o de uma integrante de uma equipe de nado sincronizado. Eu estava me sentindo atraído por ela, e estava gostando daquilo... seria legal tentar esquecer Maria Luiza por uns tempos, antes que eu estivesse na cama com outra mulher e "a visse".

Quando falávamos sobre o filme "Adeus, Lênin!" - mais um ponto em comum entre nós: ele estava na lista de "os cinco melhores filmes" de ambos -, uma voz digitalizada anunciou: "Voo 4761 da TAM, com destino a Curitiba, irá partir daqui a dez minutos". Fiquei meio que "anestesiado" quando soube que iríamos no mesmo voo, mas não em poltronas "vizinhas". Ela ficaria ao lado de uma apresentadora de um desses programas televisivos insossos, exibidos na parte da manhã; e eu, ao lado de um executivo ao melhor estilo "porco capitalista". Foi um pouco árduo negociar com a apresentadora (com o executivo não haveria acordo, pois o cara estava revoltado por ter de viajar na classe econômica), mas foi possível trocar de lugares... eu e Ana Maria poderíamos viajar juntos.

Retomamos (ou melhor, ela o fez) o diálogo sobre filmes europeus; e ela começou a falar sobre o filme "Asas do desejo", de Wim Wenders; e ela rira ruidosamente quando eu disse que ele era uma versão decente de "Cidade dos anjos"... e eu ria por osmose, para tentar aliviar a ansiedade pré-decolagem. Para a minha (falta de) sorte, no exato instante em que Ana Maria parara de rir, o avião estava decolando. Estava visivelmente abatido, tal qual alguém que presenciou um assalto; e as minhas mãos suavam ao ponto de, caso alguém as visse, acharia que eu as lavara e não as enxugara... Ana me lançou um olhar com um quê de compaixão e de escárnio; e me perguntara se estava tudo bem. "Sim... só tenho um pouco de medo de altura". Por algum motivo (des)conhecido, ela a começou a rir debochadamente e me disse um insólito "Relaxe, seu bobo!". Se isso tivesse sido falado em outras circunstâncias (e por qualquer outra pessoa), eu teria ficado puto da vida; mas achei graça dessa fala dela.

A (pseudo) turbulência havia passado, e eu já respirava aliviado (ou melhor, respirava) - já conseguia até fingir que não havia acontecido nada, apesar da cara de escárnio da Ana. A conversa havia tomado a perigosa e traiçoeira rota dos relacionamentos - justamente o que eu temia. Ela havia comentado sobre os affairs (fiquei surpreso ao saber que ela nunca havia ido a fundo em um relacionamento, apesar de sua beleza estonteante e de seu estilo, digamos, instigante); e eu havia me limitado a respostas quase monossilábicas sobre o meu casamento e sobre um ou outro affair (nunca me senti à vontade para falar sobre mim).

Conversávamos sobre os interesses de ambos - ela, seguramente, não gostou muito de saber que eu não passava de um roteirista frustrado, e falava comigo só para passar o tempo - e estava integralmente voltado para o que ela falava (apesar do meu jeito aparentemente "distante de tudo")... Quando ela comentou que (também) tinha medo de viajar de avião, tive a sensação de que ela falara palavras mágicas (não necessariamente positivas): uma turbulência (de fato) estava prestes a se iniciar.

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